sábado, 12 de julho de 2008

Toque

Nesse jeito especial, ensinei-me a voar
Na imaginação levei-me a sonhar,
E por muito que queiras imaginar,
Nunca conseguirás perceber como é o toque da minha mão.

Apenas agora descobri
Que a imaginação leva-nos aonde queremos
Sinto o corpo a tremer, a compulsão intensifica-se
Esta obsessão leva-me à loucura
Nunca consegui perceber como é o toque da tua mão

Sinto-me dentro de ti
Estas novas descobertas libertam-nos
E não é presunção pensar e querer
Saber como será o toque das nossas mãos.

Amanhece

Parece amanhecer, no meio daquela tarde enublada, pela cinzas que correm com a maresia, sente-se o odor do desconhecido, e só aí nos apercebemos que tudo se desmorona à nossa volta.

Parece amanhecer, quando estamos sós, ao abrigo do infortúnio, à desconfiança da nossa razão, onde nos perdemos e encontramos num razão de segundos.

Parece amanhecer quando me dou a conhecer, quando sorrio levemente, mostrando uma timidez inevitável, no fundo julgando ser a expressão mais aterradora à face da terra.

Parece amanhecer, quando me encontro comigo mesmo, onde descubro as minhas trevas e as deixo libertarem-se, as deixo fugir, dando lugar a um lugar idílica mas extremamente exânime.

Parece amanhecer, que demonstro a loucura de uma mente cansada, quando me exprimo da forma menos usual, quando sou livre para inovar e inventar uma personagem que só me cabe a mim.

Parece amanhecer, porque vejo o sol, ora quente nas minhas costas, ora gélido quando fecho os olhos.

E no rodopiar das sensações mais inusitadas, sinto que ainda estou vivo, aliás este cheiro esquisito que me entra pelas narinas me faz sentir curioso. O que será?

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Voz


Eu sou a voz
A voz dessa tua consciência adormecida
A voz do passado e do futuro que te espera
A voz da tua natureza e de algo que ainda virá
Não tenhas medo, porque hoje saberás
Eu sou a voz que o caminho guiará

Trago a força que deixaste outrora perdida
Sou o grito abafado pelos medos alheios
Vá, não tenhas medo, outra vez
Eu sou a voz que te conhece bem

Eu sou a voz, aquela da brisa do mar
Eu sou a voz, aquela da raiva escondida
Eu sou a voz, a que te traz a esperança
Sou como a força da Primavera a florescer

Não te esqueças de mim
Eu sou a voz que espera por ti
Sou aquilo que desejas, na alvorada pronunciada
Sou a cura da ferida, a chama da dor
Vá responde-me... eu sou a voz que chama por ti!

sábado, 7 de junho de 2008

Saudade

Por que é que a saudade às vezes nos corrói? Não consigo fechar os olhos, as lembranças enchem o panorama, o coração acelera, a ansiedade instala-se e um desejo incontrolável de voltar ao passado atormenta todo o meu ser.

Será nostalgia, saudosismo ou apenas recordações saudáveis? Ah mente perversa, de tanto serves, mas de tanto me fazes sofrer. Fragmentações desproporcionadas de um tempo repleto de sorrisos e de outros com olhares lacónicos de desinteresse.

O tempo passa e não espera por nós, serei eu um incapaz de o acompanhar. Só ele, o tempo, o dirá. Por minha parte, fica apenas a saudade!

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Olhar

Por que é que não conseguimos olhar fixamente durante poucos segundos? É inegável que desconhecidos não se conseguem encarar. Alguma vez parámos para pensar como é difícil confrontar alguém que se cruza connosco na rua, alguém que está no mesmo café ou, simplesmente, alguém que vai sentado à nossa frente naquele trivial autocarro? O olhar, este acto simples e complexo ao mesmo tempo, que comporta tanta ciência. Os segundos de estatismo no olhar aumentam com os anos em que conhecemos a pessoa. Aos poucos e poucos vamos roubando tempo ao tempo. Esse que fomenta o conhecimento, esse que no ajuda a encontrar o suporte no olhar do próximo.

O quão perigoso poderá ser olhar de forma leviana para aquele ser que vai à nossa frente. Talvez fôssemos mal interpretados, pois das duas uma, ou queríamos algo íntimos com essa pessoa, ou seria um olhar puramente belicoso.

Oh mas sei que outrora não foi assim, antigamente olhava com despudor, com a despreocupação inocente de quem não teme o confronto, olhava daquela forma que talvez fosse a mais correcta e verdadeira, pois sabia que daí não resultaria nenhuma consequência negativa. Será que pode ser assim outra vez?

terça-feira, 22 de abril de 2008

Lenço

Outrora longos, viu-os desaparecer, fio a fio, como se os contasse, olhava de forma lânguida aqueles finos e frágeis cabelos. Escorriam-lho pelos ombros e por fim caiam no chão, de forma suave e paulatina. Toda a sua vida mudara no instante em que soubera da notícia, queria desaparecer para não sofrer. No entanto, todos lhe deram força para continuar a lutar. Aquele lenço na cabeça era a sua marca, aprendeu a não se envergonhar da sua situação. Agora era uma mulher forte e determinada, com esperança de que tudo fosse passageiro e plenamente convicta que tudo tinha uma razão, nada acontecia por acaso. Talvez fosse uma prova, um castigo, ou uma partida do destino!

O tempo passou, o vento ficou mais sereno e, aos poucos, os seus cabelos cor de ouro começaram a crescer. Voltava a ser a mesma de sempre, o sorriso acendeu-se e tudo retomava o seu curso!

Lá em casa chamavam-lhe «lencinho» e, habitualmente, usavam o mesmo adorno em sinal de normalidade, não forçada, mas necessária. Era feliz e compreendida!

A sua filha era quem mais a apoiava, era alegre e vincadamente teimosa naquilo em que acreditava. Todavia, estes últimos meses tinham ido muito abaixo. Pese embora o facto de sua mãe estar completamente recuperada, tinha perdido as forças e o ânimo. Algo não ia bem, sentia-se desesperada, mas não mostrava. Sem saber bem porquê o azar tinha chegado à sua porta. E agora vejo-a, a caminhar neste corredor, com passos suaves! Entra no quarto, baixa-se custosamente e retira-o da gaveta. O lenço vermelho ia ter a mesma utilidade!

terça-feira, 1 de abril de 2008

Brinquedo

Oh aquele brinquedo que o fazia viajar, querer chegar lá! Que grande e belo, estupendo de faces rectas e traços vincados. Virava, girava, esticava, metamorfoses forçadas pelas mãos da criança que grita, chora e vive!

Oh esse brinquedo que lhe transformava o coração, esse "brinquedo de corda", transfigurado em algo irreal. Sentia a cabeça a voar, os segundos a esvanecerem pelos dedos sujos da terra, o cheiro a terra molhadas, e o verde cintilante da relva acabada de plantar. Era o ciclo da vida, na sua potência máxima. E a criança brincava, feliz e descomprometida, naquele seu jeito tão próprio.

Com aquele brinquedo, apenas aquele, conseguia colocar o seu pensamento noutro local, um rodopio em catadupa frenética. Em torno dele podia partir e chegar àquela estação do sonho, onde se conheceram e despediram. Lembras-te? Oh o sonho cresce, enche o espírito de vontade. E não digas que é estupidez querer o imaginário.

Com o brinquedo viajava, sim, ia àquele sítio e voltava, gostava de fazer amigos. Eram momentos solitários, mas repletos de momentos intensos.

Aninhava-se baixinho, sorria intensamente, fechava os olhos vincadamente, apertava o brinquedo contra o peito e partia. Que ritual tão simples e singelo!

Aquele simples brinquedo era assim, consumia-lhe as forças, mas dava-lhe vida. Através dele conseguia personificar-se, através dele era feliz. E não é ridículo por ser utópico. Ridículo é não sonhar, ridículo é não viver.

Ai, o meu brinquedo!